sexta-feira, 28 de março de 2008

Janus

Aproveito alguns instantes de ataraxia e liberdade laboral para explanar e divagar descomprometidamente. Desta feita, e por me encontrar distante e desprovido de um objectivo com este escrito, parto apenas de um mote ou preconização vulga de um tema, que na verdade, se bifurca neste binómio: premissa e concretização.


Exije-se de uma obra, de uma produção, invariavelmente a sua progenitura, que disponha de uma premissa, de um prefácio lógico e pensado que sustente a própria concepção; em última instância, apelidemos ou aceitemos a premissa de um discurso, diálogo ou reivindicação, como os pressupostos que regem e diligenciam o firmamento dessa mesma obra.


Ora, socorrendo-me do velho ditame: "De boas intenções está o inferno cheio.", o ardiloso busílis da premissa e do resultado da sua condição, é a incoerência frequentemente consumada entre o que se pretende e o que se consegue.


Acreditando na obra artística e, honrosamente humana, como oscilante, variável, indefinida, neste caso como noutros, a mise en scène, o invólucro e revestimento simbólico de uma produção, legitimam-na ou denigrem-na; existe por isso, aquilo a que chamo idiossincrasicamente: a condição de Janus, num projecto e consequente concretização; Janus, deus do passado e do futuro, dipondo as duas cabeças, uma para a frente (futuro), outra para trás (passado), descreve um pouco do que acredito ser o processo de edificação de algo: a premissa - a cabeça do passado, e a concretização - a cabeça do futuro; o perfeito conluio entre ambas é inverosímil; podemos apenas aspirar a um litígio entre o que desejamos e somos capazes de conseguir; mas, mais reverberante ainda, aquilo que somos capazes de conseguir desejar.

quarta-feira, 26 de março de 2008

Reverse Graffiti

Nem mesmo aqueles que procuram ser amigos do ambiente são compreendidos.



Alexandre Orion (www.alexandreorion.com)

segunda-feira, 24 de março de 2008

Juízos

A primeira coisa que se ensina a um estudante de arte ou design é a diferenciar entre juízo de gosto e juízo de valor.

Juízo de gosto é aquele que todos temos desde a nascença, baseia-se apenas na experiência sensível de prazer ou desprazer com o objecto de apreciação estética. É um juízo extremamente subjectivo, dependente dos gostos aleatórios de cada um e como tal egoísta e na maioria das vezes injusto (principalmente se o apreciador tiver "mau gosto").

O juizo de valor baseia-se numa avaliação equilibrada e esclarecida (dentro das limitações de cada um) daquilo que são as qualidades e os defeitos do objecto estético. É um juízo justo (passo o pleonasmo) porque não se baseia apenas em gostos pessoais, mas sim numa equação de esforço técnico/criatividade com resultado estético final.

Exemplo de um juízo de valor, é o caso de uma ilustração de que não gostamos pela cor, ou pelo estilo de desenho mas que avaliamos como muito boa pela qualidade técnica, pela genialidade do conceito ou até mesmo pelo grau de dedicação e esforço que transpira do trabalho.

E não precisamos de ser artistas, nem designers para fazer juízos de valor, até porque no caso de sermos leigos na matéria o valor do trabalho é sempre maior! Afinal, se não sabemos como se faz ou se não conseguimos fazer melhor, será que isso não confere logo um valor elevado ao que está sob apreciação?

A próxima vez que avaliarem algo, lembrem-se que não está em jogo apenas o vosso gosto mas também o valor intrínseco daquilo que avaliam...

quinta-feira, 20 de março de 2008

Pesso[as]


"Sou a cena viva onde passam vários actores, representando várias peças"

Este é o mote encabeçado por Bernardo Soares, heterónimo pessoano com vincadas parecenças com Pessoa Ortónimo, que intitula o prefácio, o móbil e a essência da desfragmentação pessoana do Eu. Pessoa veste e desveste, usa e toma partido por trajes e máscaras várias, no seu Castelo feito de pedras de consciência; numa torre píncara e idílica, nos contos nunca ouvidos do seu devaneio, Pessoa perde-se e desliza pelo pó pensado do soalho, na casa de espelhos que é o seu intelecto. Espero conseguir ter passado uma estilização de um mestre que me influenciou e influencia tanto e, que, é sem dúvida um legado do espólio escrito português. O génio, a criança convalescente, o ardil e múltiplo-Pessoa.



Ai está uma nova Manga Curta produzida e pontinha para sair a voar para a caixa de correio. Parabéns ao Sofisma pelo excelente trabalho, que teve uma pontuação inequívoca e exemplar!

É uma boa ilustração daquilo que se consegue com esforço e dedicação ;)


Para comprarem esta Manga Curta
http://www.mangacurta.com/artigos/pesso-as

sábado, 15 de março de 2008

Sebastião Rodrigues

Talvez mais importante que defender o uso da língua portuguesa no design seja divulgar o design português, principalmente aquele que se fazia antes da globalização da criatividade.

Sebastião Rodrigues é por muitos considerado o pai do design português, nasceu em 1929 no Dafundo e começou a sua carreira de artista gráfico a fazer biscates para o jornal A voz, onde o seu pai dirigia a secção de publicidade. Em 1945, recebe um convite para entrar na APA (Agência de Publicidade Artística) onde toma contacto com vários designers experientes como José Espinho, Manuel Lapa, Carlos Botelho e Manuel Rodrigues. É com o último que irá desenvolver uma parceria de 3 décadas de atelier, que começa com a ligação ao SNI (Secretariado Nacional de Informação).





Desenvolve um grosso de trabalho ligado à divulgação da cultura e tradição portuguesa, que vai tornar-se mais intenso com a bolsa que a Fundação Calouste Gulbenkian lhe atribui em 1959, para que este viaje pelo norte do país em busca das expressões gráfico/plásticas populares.





Esta pesquisa pelo tradicional irá marcar a sua restante obra, que no geral se caracteriza pelo uso de espaços negativos e formas de cor plana, formas inspiradas no bordado e na ourivesaria de duriense e re-invenções dos "motivos" da calçada portuguesa.


quarta-feira, 12 de março de 2008

Inglesismos I

Uma dos factores mais proeminentes do design (e ainda mais do marketing) made in Portugal é o uso da língua inglesa como factor de valorização qualitativa dos trabalhos e das estratégias. Mas de onde veio esta noção, muitas vezes inconsciente, de que ao colocarmos inglês numa t-shirt, num cartaz ou no nome de um produto, estamos não só a elevá-lo a categoria do design avant-garde como também a premeditar-lhe o sucesso, como algo garantido pelo favor dos deuses?

É fácil tecer as justificações do costume, que o inglês é a língua mais falada do mundo (o que é uma falácia, pois esse lugar é ocupado pelo mandarim) e como estamos numa época de globalização, não podemos trabalhar para "minoria" que fala português (Portugal, Brasil, Macau, Angola, Moçambique, Cabo Verde...). Parece-me no entanto que aquilo que o subconsciente, de quem usa o inglesismo como regra, está realmente a formular é "em português soa mal e parece menos sério".

Não estou a condenar que ingenuamente deixem o preconceito e o estereótipo ganhar na luta racional que fazem na execução de um trabalho, até porque é fácil perceber de onde essa resistência surge.

Primeiro da nossa educação que teima em não privilegiar e incutir o orgulho pela milenar cultura lusitana, porque ao contrário de povos como o americano, que têm uma história curta e manchada pela violência, os portugueses têm uma história que remonta a milénios antes de Cristo, recheada de períodos violentos mas também com uma tolerância e pluralismo cultural que é inveja de muitos historiadores estrangeiros.

Segundo por uma questão simples. Todos os bons livros de design e todos os grandes teóricos do design são estrangeiros! Ora se desde novos lemos sobre design em inglês é perfeitamente normal que passemos a associar automaticamente o inglês com design (e que pensemos que se não for assim é foleiro).

A questão está em perceber se estamos no trabalho em mãos a cair na esparrela do nosso inconsciente ou a assumir a escolha como algo que faz sentido do ponto de vista funcional, ou seja, se a mensagem beneficiar dessa escolha. Cada trabalho é um caso e temos de pesar sempre cada factor para o sucesso do todo.

Há ideias que decerto surgem em inglês logo mas o que todos os profissionais da criatividade afirmam é que devemos ter sempre resistência à primeira ideia, não significa que a abandonemos mas esta tem de ser estudada e pesada face a outras, antes de nos atirarmos de cabeça. Porque nem sempre o que surge em inglês fica mal em português e vice-versa e porque quem se atira de cabeça para uma piscina sem água... acaba por rachá-la.

terça-feira, 11 de março de 2008

Motion Design


Não podemos ficar indiferentes a este vídeo, por isso, é melhor ver para crer.



Descrição: Extracto do mais recente E.P. dos Justice.

Direcção: So-Me / Machine Molle (www.machinemolle.com)

Obra de Arte

Uma obra de arte, definindo-se como tal é universal e um meio comunicativo enriquecedor que fornece ao observador, apreciador de arte ou não, uma visão única do que por vezes pode parecer banal a este.

Arte

Espera-se do artista que seja bifurcado. Espera-se do foco gerador que eternize o detalhe; espera-se que apresente o universo ético na estrutura singular de cada gesto?

Concordo com as palavras de Baudelaire, quando se refere à dicotomia da arte, como eterna e transitória, auferidora de ambos os elementos; no entanto, pergunto-me, não será este exercício de amplificação, de dilatação, uma relativização da própria arte? Neste ponto, sustento-me no pragmatismo de A. Loos; a obra feita é – segundo ele – tão mais exímia quanto a razão do seu ajuste e acutilância, ao tempo em que se insere, e, o esmorecimento pelo desgaste desse tempo, for.

Se à progenitura de um artista, se impõe que preste vassalagem a uma apresentação de valores maiores, que seja holística; esta elasticidade não falsifica a moedagem da própria arte?

Aceito que uma obra sugira. Que detenha uma condição implícita, uma vinheta não matriculada superficialmente, e que, esta, remeta para a tónica do artista e para a sua ética. Todavia, não creio que o artista deva desfocalizar a ética sucinta/restrita da obra premente, em detrimento de aspirações maiores; não se criará um estado decalé entre obra e intenção?

O artista não pode senão sugerir, em jeito de sinédoque, toda a “intenção ausente” da obra feita. São rasgos de carácter sublimados e inculcados, inefáveis, na obra, que a consagram.

Mas assim sendo, não viajamos na vereda da representação?

Como disse Wim Wenders a respeito do cinema a preto e branco:

“O cinema a cores é mais real, contudo, o cinema a preto e branco é mais realista.”

Acredito que deverá existir no artista, uma condição de Janus (deus do passado e do futuro); deverá ser bifurcado ou bífido; uma cabeça disposta para tudo o que pretenda incrementar na obra viva, outro, virado para o futuro; para toda a prolixidade e derivância em que incorrerá (a obra).

É dever do designer incutir duplamente: a obra e quem a manuseia.

segunda-feira, 10 de março de 2008

Do que é feita uma comunidade?

Uma comunidade não existe sem pessoas.

Por isso mesmo, para que este blog seja comunitário precisamos que todos os manga curtenhos, que tenham site e/ou blog nos informem para serem adicionados à lista na barra direita.

Dessa forma não só sabemos mais acerca de cada um como aumentam a vossa exposição no grande emaranhado que é a world wide web.

sábado, 8 de março de 2008

O Homem sonha, Deus aprova e a Obra nasce...


Desde o inicio que o Manga Curta tem sido um espaço óptimo para o desenvolvimento dos designers e ilustradores portugueses (mesmo que ainda hajam muitos que se pensam acima de uma participação num concurso aberto a todos) mas também desde a sua fase mais incipiente que se tem mostrado um espaço insuficiente para um diálogo mais especifico da ética e técnica dos criativos.

Pelo seu tamanho descomunal que agrega centenas de conteúdos e por se tratar de um concurso aberto a todos e não apenas aos criativos, a agregação de um fórum de discussão ao site Manga Curta não tem sido possível.

Dai ter nascido entre alguns de nós uma vontade de criarmos uma comunidade satélite que agregasse aqueles que se conhecem do concurso num diálogo mais aberto e para os leigos mais encriptado. Para outras opiniões que não ficam bem num site que afinal é o pão de várias famílias. Começámos inocentemente pela criação do www.mangacurta.deviantart.com, esperando que ao inserirmos a comunidade num site de "artistas" ganhássemos até alguns novos participantes.

Como pensadores excessivos que somos achámos que o que precisávamos era de um site interactivo mas apesar de termos conhecimentos de web design suficientes, não tínhamos fundos para comprar um servidor que permitisse sites complexos. Até que um belo dia da semana que passou um dos novos manga curtenhos (bakus_dionisio de seu nome) referiu que para promover estas discussões bastaria a criação de um blog e de repente fez-se luz nas engrenagens bafientas. Não só é possível como é melhor tendo em conta o crescimento megalómano da blogosfera.

E cá estamos. Ainda faltam vários convites para colaboradores e o apadrinhamento publicitário do Manga Curta mas vamos ter aqui algo interessante que esperamos que cresça e desabroche em algo maior. Pelo menos vamos regar e cuidar com carinho e dedicação e pedimos o mesmo da vossa parte.

Mais novidades para breve!