terça-feira, 11 de março de 2008

Arte

Espera-se do artista que seja bifurcado. Espera-se do foco gerador que eternize o detalhe; espera-se que apresente o universo ético na estrutura singular de cada gesto?

Concordo com as palavras de Baudelaire, quando se refere à dicotomia da arte, como eterna e transitória, auferidora de ambos os elementos; no entanto, pergunto-me, não será este exercício de amplificação, de dilatação, uma relativização da própria arte? Neste ponto, sustento-me no pragmatismo de A. Loos; a obra feita é – segundo ele – tão mais exímia quanto a razão do seu ajuste e acutilância, ao tempo em que se insere, e, o esmorecimento pelo desgaste desse tempo, for.

Se à progenitura de um artista, se impõe que preste vassalagem a uma apresentação de valores maiores, que seja holística; esta elasticidade não falsifica a moedagem da própria arte?

Aceito que uma obra sugira. Que detenha uma condição implícita, uma vinheta não matriculada superficialmente, e que, esta, remeta para a tónica do artista e para a sua ética. Todavia, não creio que o artista deva desfocalizar a ética sucinta/restrita da obra premente, em detrimento de aspirações maiores; não se criará um estado decalé entre obra e intenção?

O artista não pode senão sugerir, em jeito de sinédoque, toda a “intenção ausente” da obra feita. São rasgos de carácter sublimados e inculcados, inefáveis, na obra, que a consagram.

Mas assim sendo, não viajamos na vereda da representação?

Como disse Wim Wenders a respeito do cinema a preto e branco:

“O cinema a cores é mais real, contudo, o cinema a preto e branco é mais realista.”

Acredito que deverá existir no artista, uma condição de Janus (deus do passado e do futuro); deverá ser bifurcado ou bífido; uma cabeça disposta para tudo o que pretenda incrementar na obra viva, outro, virado para o futuro; para toda a prolixidade e derivância em que incorrerá (a obra).

É dever do designer incutir duplamente: a obra e quem a manuseia.

1 comentário:

Unknown disse...

"Na tela, é a harmonia do conjunto que realiza a obra de arte. E esta é contemplada por um olhar frio e por uma alma indiferente. Os entendidos admiram a execução, como se de um equilibrista se tratasse, e apreciam a pintura como quem saboreia um pastel. As almas famintas partem famintas.
A multidão percorre sala a sala, considerandos as telas bonitas e sublimes. Aquele que poderia ter transmitido algo ao seu semelhante nada disse, e quem poderia ter entendido, nada entendeu.b
É o que se chama a arte pela arte."

Diz Kandinsky no seu Do Espiritual na Arte sobre a arte puramente plástico-técnica mas poderíamos radicalizar ainda mais o discurso dizendo que o design não pode ser "design pelo design" correndo o risco de não o ser de todo.

E sobre o artista que "não tem muito para dizer, basta-lhe uma diferença insignificante, para se tornar reconhecido e apreciado por um grupo de mecenas e de amadores de arte (o que pode proporcionar-lhe grandes benefícios materiais!). Assim, vemos uma massa de homens dotados de um talento aparente atirarem-se sobre uma arte que afinal parece tão simples de conquistar."